por Carlos Alberto Sardenberg | O Estado de S. Paulo
O custo Brasil é uma invenção nossa, tanto a expressão – que não aparece em análises de outras economias pelo mundo – quanto a coisa em si, a teia de burocracias mais o preço e a ineficiência de fatores como a infraestrutura e a mão de obra. É algo tão entranhado na vida do nosso país que parece até uma fatalidade.
A última semana nos deixou vários exemplos disso. A presidente Dilma Rousseff falou mais de uma vez sobre o peso dos impostos e relacionou como um objetivo a redução da carga tributária cobrada sobre a energia elétrica.
Era a presidente da República a falar disso e, de outro lado, o governo do Amazonas aumentando para 30% o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre energia e telecomunicações – o que, aliás, se choca contra o plano do Ministério das Comunicações de baratear a banda larga.
Além disso, a Companhia de Gás de São Paulo (Comgás) anunciava que vai elevar o preço do gás para a indústria no Estado de São Paulo, insumo que recebe da Petrobrás.
Reintegra. Mas talvez um caso exemplar de como o custo Brasil sempre leva a melhor está no Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras (Reintegra) – o dinheiro que o governo federal está pagando aos exportadores, uma espécie de prêmio para baratear e estimular as vendas externas.
O prêmio é de 3% sobre o faturamento das exportações. Demorou para ser implementado, mas saiu e as empresas já recebem o reembolso ou o utilizam no abatimento de outro imposto. Tudo bem?
Parece, mas aí vem a Receita Federal e questiona: Se esse reembolso não é uma redução de impostos (porque a exportação é isenta), como classificar o caso na contabilidade?
É um dinheiro, digamos assim, dado – logo, entra como receita. E, se é receita, então paga PIS-Cofins, Imposto de Renda (IR) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). E isso simplesmente come quase a metade do benefício concedido. O governo recolhe uma parte de volta, mas com uma burocracia adicional. Pode? Nem se pode dizer que se trata de maldade da Receita Federal. É assim mesmo, a lei manda classificar como receita e cobrar. Custo Brasil no auge.
Sem confessar. Mas existem também manobras deliberadas para aumentar impostos sem confessar. É o que está fazendo a Secretaria da Fazenda de São Paulo com a indústria automotiva. Trata-se da substituição tributária do ICMS, um esquema para facilitar a arrecadação e a fiscalização.
O fabricante do automóvel, por exemplo, recolhe o imposto devido por ele mesmo e também o imposto devido pela concessionária. Mas como o fabricante sabe qual será o preço cobrado pela concessionária?
Não sabe. Então, o governo estima esse preço e calcula um preço final, utilizando um índice de valor agregado (IVA) de, por exemplo, 30% (dependendo do setor). O que está acontecendo?
A Fazenda paulista majorou esse índice para alguns setores – o que, na prática, é um aumento de carga tributária. Com a queda nas vendas de automóveis, é um golpe do governo para não perder arrecadação e, assim, não precisar cortar gastos. E os preços na cadeia automotiva já estão subindo. Depois dizem que não sabem por que os automóveis brasileiros são os mais caros do mundo.
Carga permanente. Tratei desses assuntos em meu programa na Rádio CBN, na semana passada, e alguns ouvintes me mandaram outros exemplos.
Hermínio conta: “É o caso dos 11% para a seguridade social, retidos nas notas fiscais de prestação de serviços. Esse dinheiro não é 100% compensado na emissão das guias de GPS dos funcionários. Fica um resíduo na mão do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que precisa ser requerido através de ação administrativa. Demora anos. Tenho duas empresas de prestação de serviços que, juntas, deixam mensalmente aproximados R$ 32 mil. Estou falando de R$ 384 mil anuais, que engolem nossa lucratividade. A lei foi criada em 1998 pelo Fernando Henrique Cardoso, e essa injustiça nunca foi corrigida, penalizando as pequenas e as médias empresas, que têm por finalidade gerar emprego e têm margem apertada”.
Márcio conta: “Trata-se do Imposto sobre Serviços (ISS). O Decreto Lei n.º 406 de 31/12/1968 determina que o imposto seja recolhido no município do prestador de serviço. Outras leis, entretanto, permitem a retenção no município onde o serviço é prestado. Resultado: recolho duas vezes pelo mesmo serviço (10%)”.
São casos antigos, reclamados e debatidos – e vai ficando por isso mesmo, cada vez mais caro produzir no Brasil.
Bom para poucos. É verdade, por outro lado, que alguns setores podem ganhar. Por exemplo: a nova forma de contribuição previdenciária que entrará em vigor em agosto.
Para muitas empresas, a contribuição sobre a folha de salários (20%) vai ser substituída por um imposto de 1% sobre a receita. Isso pode representar uma razoável economia tributária e, portanto, um aumento na margem de lucro.
Mas só vale para alguns setores. A carga tributária geral não cai. E o conjunto da obra do custo Brasil acaba pesando mais.